CGJ/SP: Registro de Imóveis – Recurso administrativo – Pretensão de averbação de ata de assembleia de adquirentes de futuras unidades autônomas, pela qual a incorporadora foi destituída – Inexistência do registro dos contratos pelos adquirentes, e, consequentemente, comprovação de que a votação pela destituição se deu pela maioria absoluta dos votos dos adquirentes – Ofensa aos princípios da especialidade subjetiva e da continuidade – Recurso não provido.


  
 

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 2015/62711
(143/2015-E)

Registro de Imóveis – Recurso administrativo – Pretensão de averbação de ata de assembleia de adquirentes de futuras unidades autônomas, pela qual a incorporadora foi destituída – Inexistência do registro dos contratos pelos adquirentes, e, consequentemente, comprovação de que a votação pela destituição se deu pela maioria absoluta dos votos dos adquirentes – Ofensa aos princípios da especialidade subjetiva e da continuidade – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso administrativo interposto pela Comissão de Representantes dos Adquirentes de Unidades Habitacionais do Edifício Barcelona Cambuí contra a decisão do MM. Juiz Corregedora Permanente do 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas, que indeferiu o pedido de averbação da ata da assembleia que destituiu a empresa Barcelona Cambuí Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda, incorporadora do Condomínio Edifício Barcelona Cambuí, registrado na matrícula número 77.991, sob o fundamento de que há ação judicial em curso, na qual será verificada a legitimidade das partes e a aplicação ou não do artigo 43, inciso VI, da Lei n° 4.591/64, e que é naquela demanda que os interessados deverão buscar a superação dos óbices apontados.

Acrescenta a r. decisão recorrida que mesmo que se os documentos juntados demonstrassem a notificação da incorporadora e seu não atendimento, ainda assim restaria o óbice relacionado ao registro dos títulos aquisitivos dos adquirentes das futuras unidades habitacionais autónomas.

A recorrente alega que não há previsão na Lei n° 4.591/64 de que é necessário o registro dos contratos pelos adquirentes das unidades autônomas, razão pela qual não pode o Oficial exigir aquilo que a lei não exige. Aduz que a ata da assembleia menciona que a notificação judicial foi efetuada e aponta qual o juízo, além de mencionar sobre a ata notarial lavrada, e que a demonstração de que a destituição da incorporadora foi aprovada pela maioria absoluta dos adquirentes é circunstância aferível mediante simples verificação do número de votantes na ata exibida e registrada.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

Opino.

A recorrente pretende averbar a “Ata da Assembleia Geral dos Adquirentes do Edifício Barcelona Cambuí”, realizada no dia 13 de novembro de 2013, na qual foi discutida e votada a destituição da incorporadora, em razão da paralisação das obras há cerca de um ano. A negativa de averbação decorre das seguintes exigências: necessidade de registro dos títulos aquisitivos dos adquirentes das futuras unidades autónomas; comprovação da notificação judicial da incorporadora e seu não atendimento; e apresentação de pedido de destituição firmado por maioria absoluta dos proprietários.

No curso do procedimento, vieram aos autos duas consultas de processos em andamento, uma delas referente à notificação judicial e outra à ação de imissão de posse, ajuizadas pelo Edifício Barcelona Cambuí contra Barcelona Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda (fls.342/343 e 399/341, respectivamente).

Verifica-se, pois, que no momento em que o título foi apresentado para averbação, não obstante tenha constado da ata a realização da notificação, e também a ata notarial lavrada, não havia nenhum documento comprobatório de sua efetivação.

Ainda que a referida consulta processual posteriormente juntada aos autos demonstre a notificação judicial realizada, os demais óbices – registro dos títulos aquisitivos dos adquirentes das futuras unidades autónomas e apresentação de pedido de destituição firmado por maioria absoluta dos proprietários, pendem de cumprimento e foram corretamente apresentados pelo Oficial.

Com efeito, embora a Lei n° 4.591/64 mencionada pela recorrente não exija o registro dos contratos dos adquirentes das futuras unidades autônomas, a Lei de Registros Públicos exige.

O Oficial Registrador, ao qualificar um título, tem o dever de “proceder o exame da legalidade do título e apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e sua formalização instrumentar (Afrânio de Carvalho, Registro de Imóveis, editora Forense, 4ª edição). O exame da legalidade consiste na aceitação para registro ou averbação do título que estiver de acordo com a lei.

Dentre os princípios que vigoram e regem os registros públicos, temos os da especialidade subjetiva e da continuidade, previstos na Lei de Registros Públicos.

Afrânio de Carvalho, ao tratar do tema, assim se manifesta:

“…importa lembrar que o título atual só é admissível no registro quando aí encontre outro pretérito a que possa ligar-se: o encadeamento há de ser ininterrupto. Essa afirmação não é senão um corolário de preceito latente do sistema, por mim realçado no anteprojeto atrás aludido, segundo o qual a pré-inscrição de titular antigo é indispensável à inscrição de novo titular.” (Revista dos Tribunais 643/20 – “Títulos Admissíveis no Registro”)

O mesmo doutrinador preleciona que “O princípio da continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram a preexistência do imóvel no património do transferente.”

E acrescenta que “Ao exigir-se que todo aquele que dispõe de um direito esteja inscrito como seu titular no registro, impede-se que o não-titular dele disponha. A pré-inscrição do disponente do direito, da parte passivamente interessada, constitui, pois, sua necessidade indeclinável em todas as mutações jurídicos-reais.” (Registro de Imóveis, 4ª ed., Ed. Forense, 1998, p. 254).

Estes princípios devem ser observados não somente em relação aos casos de registro que importam em transmissão da titularidade do domínio, como também em relação aos demais atos que ingressão no fólio real, no caso em tela, a averbação.

Ainda, de acordo com as lições do mesmo doutrinador, na obra referida, ao tratar do tema “Matrícula No Registro Geral”, consigna que na relação dos cinco livros que possuem divisão completa em cinco espécies (Protocolo; Registro Geral; Registro Auxiliar; Indicador Real; Indicador Pessoal) e que têm por princípio único diretivo a função desempenhada, se sobressai, por sua importância, o “registro geral”, que, como recipiente dos direitos reais, aos quais transmite os efeitos de publicidade e de constitutividade, aparece como verdadeiro sensório do registro, de onde emanam os reflexos que movimentam o tráfico jurídico imobiliário. Este livro tem função precípua de centro de convergência de atos jurídicos de aquisição, transmissão, oneração ou extinção de direitos reais, sem que essa especificidade seja turvada pela intromissão de atos de outra natureza.

Nessa ordem de ideias, a presença da matrícula no registro geral já indica, por si só, que ela exprime um ato de movimentação de direito real e a posição eminente que aí lhe foi conferida atesta, por sua vez, que se trata do mais importante: a aquisição da propriedade. Os efeitos da propriedade só se integram com a inscrição no livro próprio.

Nesta linha de raciocínio, percebe-se, da análise da matrícula nº 77.991, que o imóvel é de propriedade da incorporadora e que houve registro da incorporação, e que, justamente pela inexistência de registro dos contratos de compra e venda das futuras unidades autônomas, a matrícula não informa quem são os adquirentes, portanto, a averbação pretendida, sem esses registros, quebra o exato encadeamento subjetivo das sucessivas transmissões e aquisições de direitos reais imobiliários, em afronta ao princípio da continuidade, previsto no artigo 225, §2°, da Lei de Registros Públicos, e que é corolário do princípio da especialidade, pois, insisto, não há demonstração, no fólio real, do necessário liame existente entre a incorporadora e aqueles que a destituíram em decorrência da paralisação das obras sem justa causa, e, consequentemente, não se sabe se a votação em assembleia pela destituição ocorreu pela maioria absoluta dos votos.

Neste sentido são os precedentes mencionados pelo Oficial em sua manifestação:

“CGJSP – PROCESSO 54/94 Localidade: Sorocaba Data Julgamento: 01/02/1994 Data DJ: 23/02/1994

Relator: António Carlos Alves Braga

(…)

E a unanimidade deve ser aferida tendo em conta todos os adquirentes de unidades autônomas, considerados como tais aqueles que constam do registro imobiliário, e não apenas a unanimidade dos presentes à assembleia convocada para deliberar acerva desse assunto. Também é de nenhuma importância a concordância ou discordância daqueles que, embora adquirentes de unidades, autônomas, não figurem no fólio real, nessa qualidade.

(…)

1ª VRP – PROCESSO 001350-0/82

Localidade: São Paulo (2º SRI) Data Julgamento:30/03/1983

Relator: José de Mello Junqueira

(…)

Ademais, alguns dos subscritores da convenção, não tem títulos registrados pelo que lhes falta legitimidade para comparecerem ao ato questionado.

(…)”

Em suma, da análise formal e extrínseca do título e documentos que o acompanham, apresentados ao Oficial, verifica-se a impossibilidade da averbação pretendida, a qual afronta os princípios da especialidade subjetiva e da continuidade.

À vista do exposto, o parecer que respeitosamente submeto ao elevado exame de Vossa Excelência, é de que seja negado provimento ao recurso.

Sub Censura.

São Paulo, 14 de maio de 2015.

ANA LUIZA VILLA NOVA

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora da Corregedoria, e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso. São Paulo, 22.05.2015. – (a) – HAMILTON ELLIOT AKEL – Corregedor Geral da Justiça.

Diário da Justiça Eletrônico de 08.06.2015
Decisão reproduzida na página 76 do Classificador II – 2015

Fonte: INR Publicações | 05/05/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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