Artigo – Renúncia de direitos hereditários: todo cuidado é pouco! – Por José Flávio Bueno Fischer

*José Flávio Bueno Fischer

No artigo deste mês, abordaremos um tema de ordem prática, bastante corriqueiro na lida diária do Tabelionato e que sempre gera muitas dúvidas: afinal, a renúncia de direitos hereditários é realmente um ato menos oneroso em termos de imposto, já que o ato em si não gera cobrança de ITCD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação)?

Vejamos a seguinte situação: João era casado com Maria, pelo regime da comunhão universal de bens, com quem tinha dois filhos, Lúcio e Tiago. João faleceu em 10/02/2016, num grave acidente de carro, deixando como patrimônio um único imóvel, no valor de R$120.000,00.

Caso a partilha fosse realizada de acordo com o que estabelece a lei, Maria ficaria com a meação, no valor de R$60.000,00, e a herança seria dividida entre os filhos na mesma proporção, ficando o valor de R$30.000,00 para cada um.

Só que Lúcio, já formado médico e bem estabelecido financeiramente, resolveu ceder sua parte na herança ao seu irmão, Tiago, que ainda é estudante. Para isso, Lúcio decidiu renunciar a herança, pois ficou sabendo que tal ato não é gerador de ITCD, enquanto que na cessão de direitos hereditários a título gratuito há incidência da alíquota de 3%, considerando o seu quinhão de R$30.000,00. Vejamos a tabela abaixo, da Secretaria da Fazenda do RS, para doações ocorridas a partir de 01.01.2016[1]:

Faixa Valor do quinhão (em UPF-RS)[2] Alíquota
Acima de Até
I 0 10.000

(R$174.441,00)

3%
II 10.000

(R$174.441,00)

4%

O que Lúcio não sabia é que, com a renúncia de direitos hereditários, o quinhão de seu irmão, que era de R$30.000,00 e, portanto, isento de pagamento de ITCD pelo fato gerador morte (menor que 2.000 UPF/RS), passou a ser de R$60.000,00 e, assim, sujeito a tributação de 3%. Vejamos a tabela abaixo, da Secretaria da Fazenda do RS, vigente para os óbitos ocorridos a partir de 01.01.2016:[3]

Faixa Valor do quinhão (em UPF-RS) Alíquota
Acima de Até
I 0 2.000 (R$34.888,20) 0%
II 2.000

(R$34.888,20)

10.000

(R$174.441,00)

3%
III 10.000

(R$174.441,00)

30.000

(R$523.323,00)

4%
IV 30.000

(R$523.323,00)

50.000

(R$872.205,00)

5%
V 50.000

(R$872.205,00)

6%

Ou seja, se Lúcio tivesse optado pela cessão de direitos hereditários em favor de seu irmão, o ITCD de 3% incidiria apenas sobre o quinhão transmitido (R$30.000,00), resultando na quantia a pagar de R$900,00. Com a renúncia de direitos, todavia, o quinhão de Tiago, que antes era isento (R$30.000,00), passou a ser de R$60.000,00 e, desta forma, sujeito a tributação de 3% sobre a integralidade do quinhão, gerando um imposto a pagar de R$1.800,00.

Neste caso, a renúncia de direitos hereditários, eleita com o objetivo de evitar tributação, acabou por gerar o dobro de ITCD.

Ademais, é importante destacarmos que a renúncia de direitos hereditários, além de poder gerar pagamento de imposto a maior, é um ato que pode causar sérias consequências patrimoniais. Por exemplo, no caso de Lúcio e Tiago. Se Lúcio renuncia a herança no intuito de beneficiar o irmão e posteriormente “aparece” outro filho do “de cujus”, como fica? Nós sabemos a resposta: o terceiro filho que “apareceu” será beneficiado com a renúncia, pois dividirá com Tiago toda a herança. Entretanto, se Lúcio faz a cessão de seu quinhão em benefício de Tiago, honrando seu objetivo inicial de beneficiar o irmão estudante, não haverá risco do terceiro filho ser agraciado com o quinhão de Lúcio.

Tudo o que aqui foi explanado demonstra como é preciso que nós, tabeliães, tenhamos cuidado e atenção com a renúncia de direitos hereditários, que, muitas vezes é tida com um ato simples e de fácil elaboração, mas que pode ter consequências patrimoniais e tributárias sérias para as partes envolvidas.

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[1] Disponível no site da Secretaria Estadual da Fazenda do RS:https://www.sefaz.rs.gov.br/Site/MontaDuvidas.aspx?al=l_faq_itcd_geral.

[2]  UPF/RS para 2016 no valor de R$17,4441, conforme site da Secretaria da Fazenda do RS:http://www.rs.gov.br/conteudo/231634/secretaria-da-fazenda-divulga-valor-da-upf-para-2016.

[3] Disponível no site da Secretaria Estadual da Fazenda do RS:https://www.sefaz.rs.gov.br/Site/MontaDuvidas.aspx?al=l_faq_itcd_geral.

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* José Flávio Bueno Fischer – 1º Tabelião de Novo Hamburgo/RS, ex-presidente do CNB-CF, membro do Conselho de Direção da UINL

Fonte: Notariado | 29/04/2016.

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TRF3: Vaga de garagem relacionada à bem de família pode ser penhorada se tiver matrícula própria

Decisão considerou impenhorável o apartamento de um casal, mas determinou a penhora das vagas de garagem.

A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) determinou a penhora de duas vagas de garagem que tinham números de matrícula separados do apartamento principal, que foi considerado impenhorável por ser bem de família.

A União havia indicado à penhora o apartamento e as duas vagas de garagem que constavam como propriedade de um réu em execução fiscal. No entanto, a moradora do imóvel, sua ex-esposa, ingressou com embargos de terceiros, alegando que aquele imóvel era bem de família, bem como as vagas de garagem, pois é utilizado como residência da entidade familiar.

Em primeiro grau, o magistrado havia considerado os bens impenhoráveis, acolhendo os argumentos da ex-esposa. No entanto, no TRF3, a desembargadora federal Monica Nobre, afirmou que a penhora pode recair sobre as vagas de garagem.

Segundo o artigo 1º da Lei 8009/90, “o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei”.

A desembargadora explicou que a impenhorabilidade prevista pela Lei nº 8.009/90 objetiva proteger bens patrimoniais familiares essenciais à adequada habitação, mas para que o bem seja protegido pela impenhorabilidade, é necessária a comprovação, pelo executado, de que se trata do único imóvel de sua propriedade ou, em caso de haver outros, que o imóvel sobre o qual recaiu a constrição é utilizado como residência da entidade familiar.

A magistrada concluiu que, no caso em questão, ficou comprovado que o apartamento penhorado serve de moradia para a embargante e seu filho, conforme os documentos juntados aos autos (contas de luz, gás, telefone, condomínio, multa de trânsito, IPVA e fatura de cartão de crédito) e, como ela não possui outros imóveis, o bem em questão deve ser considerado bem de família, portanto, impenhorável.

Porém, em relação às vagas de garagem, localizadas no mesmo condomínio, a desembargadora considerou que elas podem sim ser penhoradas, de acordo com a Súmula 449 do Superior Tribunal de Justiça: “a vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora”.

Assim, a desembargadora determinou a penhora da metade ideal das vagas, pois “não há como estender a impenhorabilidade prevista na Lei nº 8.009/90 às vagas de garagem com registro e matrícula próprios”.

Ela citou ainda, outras decisões sobre o assunto: “A jurisprudência desta Corte já decidiu que as vagas de garagem, desde que tenham matrícula e registro próprios, como no caso em exame, são penhoráveis, independentemente de estarem relacionadas a imóvel considerado bem de família” (STJ – AgRg no REsp 1554911/PR).

A notícia refere-se a seguinte Apelação/Reexame Necessário 0046594-14.2012.4.03.6182/SP.

Fonte: TRF 3ª Região |  28/04/2016.

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STF: Decisão restabelece matrícula de imóveis no Tocantins em favor da União

O ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), julgou parcialmente procedente a Ação Cível Originária (ACO) 847 para determinar o restabelecimento, em nome da União, das matrículas de 11 imóveis situados no Estado do Tocantins em faixa de terra anteriormente declarada como indispensável à segurança e ao desenvolvimento nacional. Com a decisão, é declarada a nulidade de todas as arrecadações, títulos definitivos e demais documentos expedidos pelo estado referentes a estes imóveis.

A ação foi ajuizada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) contra o Instituto de Terras do Estado do Tocantins (Intertins). De acordo com o Incra, entre 1982 e 1984, as áreas foram matriculadas em nome da União, por meio do Grupo Executivo das Terras do Araguaia-Tocantins (GETAT), segundo as normas do Decreto-Lei 1.164/1971, que declarou indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacionais as terras devolutas situadas na faixa de 100 quilômetros de largura em cada lado do eixo de rodovias na Amazônia Legal.

Em 1987, o Decreto-Lei 2.375/87 revogou o anterior, e, com base nele, o Intertins requereu o cancelamento das matrículas efetuadas em nome da União, e seu consequente registro em favor do Estado do Tocantins. Ainda segundo o Incra, a solicitação foi acolhida pelo Registro de Imóveis da Comarca de Araguatins sem observância da ressalva contida no parágrafo 1º do artigo 2º da norma, que preservava a situação jurídica das terras públicas não devolutas da União existentes nas faixas anteriormente consideradas indispensáveis à segurança nacional.

Decisão

O ministro Teori observou que as Certidões de Cadeia Dominial juntadas aos autos comprovam que, com base no decreto de 1971, a União detinha a titularidade das terras, e que, em atendimento a ordem do juízo da Comarca de Araguatins, as matrículas foram canceladas e as terras registradas em nome do Tocantins. A ordem teve amparo na decisão do STF no Recurso Extraordinário (RE) 79828, interposto em ação discriminatória que tinha por objeto identificação das terras devolutas no Município de Araguatins. Contudo, ele explicou que, naquela decisão, o Plenário do STF não determinou o cancelamento das matrículas inscritas em nome da União.

O relator constatou que a alteração do domínio das 11 áreas foi efetivada sem respaldo na decisão judicial proferida na ação discriminatória. “Neste cenário, constata-se que houve equívoco na execução do julgado no momento de sua averbação”, destacou. Segundo o ministro, o fato de, naquela ação, ter sido afastado o reconhecimento da posse de particulares das glebas não implica a identificação automática dessas terras como de domínio do estado, devendo ser observadas as prescrições contidas nos Decretos-Leis 1.164/71 e 2.375/87, que asseguram a propriedade da União.

O ministro observou que o STF, em diversos precedentes, assentou que Decreto-Lei 2.375/87, ao deixar de considerar indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacionais as terras públicas a que se refere o Decreto-Lei de 1971, preservou a situação consolidada anteriormente, uma vez que estabeleceu, em seu parágrafo 1º, que a situação jurídica das terras públicas não devolutas da União “permanecerá inalterada”. “Portanto, ainda que se entenda que as alterações de domínio das matrículas em favor do Estado do Tocantins ocorreram com fundamento no artigo 2º do Decreto-Lei 2.375/1987, tal entendimento não prospera, nos termos dos precedentes já citados”, concluiu.

A notícia refere-se ao seguinte processo: ACO 847.

Fonte: STF | 29/04/2016.

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