Artigo: Tribunal de Justiça de São Paulo edita novas súmulas a respeito de controvérsias envolvendo compra e venda de imóveis – Por Alexandre Gomide

*Alexandre Gomide

Edição dos novos verbetes (súmulas 159 a 164) ocorreu em sessão em sessão da semana passado, dia 27 de janeiro.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, nos termos do artigo 191, § 3º, do Regimento Interno, em sessão datada do dia 27 de Janeiro de 2016, editou as súmulas 159 a 164. As súmulas consolidam entendimento a respeito de debates jurídicos envolvendo a compra e venda de imóveis.

Analisemos.

Súmula 159
É incabível a condenação da vendedora ao pagamento de multa ajustada apenas para a hipótese de mora do comprador, afastando-se a aplicação da penalidade por equidade, ainda que descumprido o prazo para a entrega do imóvel objeto do compromisso de venda e compra. Incidência do disposto no artigo 411, do Código Civil.

Tal como verificado recorrentemente nos contratos de adesão de compra e venda de imóveis, há determinação que, em caso de descumprimento das obrigações por parte do comprador, será devida cláusula penal. Ocorre que não há previsão de cláusula penal para o caso de descumprimento por parte do vendedor (construtora). Nesses termos, em virtude do atraso de obras, embora silente o contrato, muitos adquirentes objetivam que a mesma cláusula penal seja aplicada aos construtores, pelo descumprimento decorrente do atraso da obra.

Ocorre que, embora silente o contrato a respeito de cláusula penal pelo descumprimento do vendedor, tal fato, segundo jurisprudência do Tribunal, “não significa possa o juiz intervir no contrato e criar nova cláusula penal, não ajustada entre as partes, para sancionar o comportamento do fornecedor. Sabido que a cláusula penal, como diz o próprio nome, tem origem convencional, de modo que não pode o juiz simplesmente substituir a vontade das partes e estender multas a novas situações jurídicas1”.

Observe-se, contudo, como asseverado pelo Desembargador Francisco Loureiro, que o fato de não haver prefixação da indenização por meio de cláusula penal “não significa que o inadimplemento do fornecedor fique indene, mas tão somente que as perdas e danos não foram previamente ajustadas e nem prefixadas entre as partes”. Assim, “embora não possa ser cobrada a cláusula penal que não fora ajustada pelas partes, a parte lesada poderá ser ressarcida de todos os prejuízos sofridos, nos exatos termos dos artigos 389 e seguintes do Código Civil2”.

Súmula 160
A expedição do habite-se, quando não coincidir com a imediata disponibilização física do imóvel ao promitente comprador, não afasta a mora contratual atribuída à vendedora.

É absolutamente comum que, embora o habite-se tenha sido expedido pela Prefeitura Municipal de São Paulo, a obra e as unidades autônomas ainda não tenham sido efetivamente entregues ao adquirente. Há casos que, entre a expedição do habite-se e a assembleia de instalação do condomínio, transcorram alguns meses.

Assim, como bem asseverado por Claudio Bueno de Godoy, “não basta apenas a emissão do habite-se se não se comprovar que concretamente disponibilizado o imóvel à utilização dos adquirentes. […] apenas quando disponibilizada a unidade autônoma para vistoria final, entregue o bem, ou passível de ser entregue, nas condições em que pactuado, é que se terá por cumprida a obrigação da ré”3.

Súmula 161
Não constitui hipótese de caso fortuito ou de força maior, a ocorrência de chuvas em excesso, falta de mão de obra, aquecimento do mercado, embargo do empreendimento ou, ainda, entraves administrativos. Essas justificativas encerram “res inter alios acta” em relação ao compromissário adquirente.

Como forma de tentar fundamentar o atraso de obras, algumas construtoras apresentam justificativas tais como excesso de chuvas, escassez de materiais e mão de obra qualificada, dificuldades na expedição de habite-se, dentre outras.

Ocorre que o entendimento do Tribunal Paulista sempre foi no sentido de que “chuvas acima da médica, redução da mão de obra e dos materiais de construção, atrasos administrativos não se enquadram dentro dos conceitos de caso fortuito ou força maior, por serem previsíveis no ramo da construção civil, razão pela qual não devem ser repassados ao consumidor4”. Ademais, a súmula 161 origina-se do enunciado 38-1 da 3ª Câmara de Direito Privado, aprovado em Janeiro de 2015.

Súmula 162
Descumprido o prazo para a entrega do imóvel objeto do compromisso de venda e compra, é cabível a condenação da vendedora por lucros cessantes, havendo a presunção de prejuízo do adquirente, independentemente da finalidade do negócio.

Entendeu o Tribunal de Justiça de São Paulo que, havendo atraso na obra, o adquirente deve ser indenizado pelos lucros cessantes, que são presumidos. Isso porque “se os imóveis que adquiriram houvessem sido entregues na data prometida, poderiam ter sido imediatamente por eles usados, quer para residir, quer para locação a terceiros. Estes danos são presumidos e consistem em lucros cessantes, consubstanciados naquilo que deixaram de receber, a título de fruto dos bens prometidos à venda5”.

Ressalte-se que o Superior Tribunal de Justiça já possuía entendimento nesse sentido, asseverando que “trata-se de situação que, vinda da experiência comum, não necessita de prova (art. 335 do Código de Processo)6”.

Súmula 163
O descumprimento do prazo de entrega do imóvel objeto do compromisso de venda e compra não cessa a incidência de correção monetária, mas tão somente dos encargos contratuais sobre o saldo devedor.

Quando do atraso de obras, muitos adquirentes pleiteiam o intitulado “congelamento” do saldo devedor. Assim, criou-se a tese que, durante o período de mora da construtora, enquanto não fosse entregue a unidade, as parcelas não deveriam sofrer reajustes.

O Tribunal de Justiça, por sua vez, entendeu não ser “possível afastar a incidência de correção monetária. Afinal, a correção monetária não é um plus, mas simples atualização de quantia corroída pela inflação”7. Assim, foi entendido que “não se mostra razoável suspender totalmente a correção do saldo devedor do contrato, porque a correção monetária não traduz qualquer acréscimo para o credor e nada mais é do que recompor o valor da moeda”8.

Arrematou-se que “a eventual mora não constitui fundamento a paralisar a incidência de correção monetária ou sua cobrança da adquirente”9.

Súmula 164
É valido o prazo de tolerância não superior a cento e oitenta dias, para entrega de imóvel em construção, estabelecido no compromisso de venda e compra, desde que previsto em cláusula contratual expressa, clara e inteligível.

Cláusula absolutamente corriqueira nos contratos de adesão de compra e venda é aquela que determina inexistir mora da construtora caso a entrega da obra atrase até cento e oitenta dias. Após verificar a eventual nulidade da cláusula, o Tribunal asseverou que, sendo ela prevista de forma clara, expressa e inteligível, “não há que se falar em violação ao direito do consumidor à informação”.

Sustentando a legalidade da cláusula, o chamado “prazo de tolerância” foi admitido “à luz do objeto do negócio – compra e venda de imóvel futuro, cuja construção, como é de conhecimento de qualquer homem médio, pode ser afetada por fatores inerentes a esta atividade, como, por exemplo, condições meteorológicas, disponibilidade de insumos e de mão de obra, greves, atrasos na obtenção de autorizações e licenças não imputáveis à construtora etc”10.

Tal como assentado noutro julgado, “não se pode olvidar os diversos fatores que interferem na construção de um edifício, tais como, aquisição dos materiais, contratação de mão-de-obra, a obtenção das licenças junto às autoridades administrativas, além de outros empecilhos de ordem natural (v.g. chuvas), os quais, efetivamente, interferem na conclusão das obras, no tempo estimado, o que, sem sombra de dúvidas, justifica a aposição desta cláusula de tolerância”11.

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1 Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação nº 1029097-26.2014.8.26.0100, Rel. Francisco Loureiro, j. 8 de Setembro de 2015.

2 Idem, ibidem.

3 Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação nº 1003826-34.2014.8.26.0161, Rel. Claudio Godoy, j. 8 de setembro de 2015.

4 Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação nº 4013715-39.2013.8.26.0405, Rel. Egidio Giacoia, j. 17 de setembro de 2015.

5 Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação nº 1007948-78.2014.8.26.0068, Rel. Francisco Loureiro, j. 19 de Maio de 2015.

6 Superior Tribunal de Justiça, REsp nº 644.984/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 16 de Agosto de 2005.

7 Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação nº 1001574-87.2014.8.26.0604, Rel. Luiz Antonio de Godoy, j. 25 de Agosto de 2015.

8 Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação nº 0117673-25.2011.8.26.0100, Rel. Carlos Alberto Garbi, j. 15 de Setembro de 2015.

9 Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação nº 4002332-49.2013.8.26.0604, Rel. Enio Zuliani, j. 10 de Setembro de 2015.

10 Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação nº 0177828-57.2012.8.26.0100, Rel. Grava Brazil, j. 20 de Novembro de 2015.

11 Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação nº 0059493-95.2012.8.26.0224, Rel. A.C. Mathias Coltro, j. 26 de Agosto de 2015.

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*Alexandre Gomide é sócio do escritório Junqueira Gomide & Guedes Advogados Associados.

Fonte: Migalhas | 05/02/2016.

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ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – ARREMATAÇÃO – VALOR EXCEDENTE

KOLLEMATA

O CSMSP publicou no último dia 4/2/2016 a intimação do acórdão proferido na Ap. Civ. 1010103-21.2015.8.26.0100 de São Paulo, cujo link se indica abaixo.

O tema posto em debate é assaz interessante e já foi diversas vezes abordado nas reuniões que se realizam todas as quintas-feiras na Sala Elvino Silva Filho, no bojo das discussões sobre a Normativa Mínima Nacional do CNJ – Conselho Nacional de Registro, coordenadas pelo desembargador Ricardo Dip.

O tema de base é a natureza jurídica da obrigação legal, cometida ao agente fiduciário, de promover a entrega do numerário excedente ao devedor fiduciante após a realização do leilão. A obrigação se encontra estampada no § 4º do art. 27 da Lei 9.514/1997, que reza:

§ 4º Nos cinco dias que se seguirem à venda do imóvel no leilão, o credor entregará ao devedor a importância que sobejar, considerando-se nela compreendido o valor da indenização de benfeitorias, depois de deduzidos os valores da dívida e das despesas e encargos de que tratam os §§ 2º e 3º, fato esse que importará em recíproca quitação, não se aplicando o disposto na parte final do art. 516 do Código Civil.

Pois bem. Qual a natureza jurídica dessa obrigação legal? Dependendo da resposta, será possível satisfazer a outra questão que se achava subjacente na suscitação de dúvida: quais são os limites da qualificação registral na verificação da efetiva devolução das importâncias que sobejaram?

Vínhamos de discutir, nas concorridas sessões da NMN do CNJ, que anteriormente à etapa do leilão, previsto no art. 27 da citada lei, a propriedade já se havia consolidado na pessoa do fiduciário. Rompido o vínculo contratual e consolidada a propriedade em virtude do inadimplemento da obrigação, remanesceria, tão somente, a obrigação, de caráter legal, de promover a entrega dos valores que sobejaram ao antigo fiduciante, já desvestido do direito de fiduciante.

Foi justamente nesse sentido a decisão do Conselho:  a obrigação de prestar contas acerca do valor excedente “é de natureza pessoal e restrita às partes deste negócio (alienação fiduciária). Não guarda, pois, nenhuma relação com o dever da instituição financeira de transferir a titularidade do domínio à arrematante”.

Em razão desse entendimento, decidiu-se que não seria atribuição do registrador, ao qualificar a escritura de compra e venda (arrematação), verificar o cumprimento do referido dispositivo legal. Enfim, a eventual inobservância do dever legal de repasse da quantia recebida pelo agente fiduciário e proprietário pleno do imóvel – “ou mesmo discordância do valor excedente apurado -, deve ser objeto de ação própria e adequada”.

A decisão nos parece correta. Diga-se: em regra, pois é sempre possível que, pela via judicial, se busque a rediscussão das condições de constituição em mora e sucessiva consolidação da propriedade, revertendo-a em favor do antigo fiduciante. Essas decisões, que vez por outra despontam no cenário judiciário, colocam em risco todo o sistema da Lei 9.514/1997. Agrava-se o quadro havendo arrematante – como neste aqui havia. Este terceiro fica irremediavelmente prejudicado, pois, fiado no registro, adquiriu a propriedade do imóvel no público leilão realizado nos termos da lei.

Eis a decisão:

Escritura de compra e venda. Alienação fiduciária. Arrematação. Valor excedente – obrigação de restituição – natureza pessoal. Qualificação registral – limites.

Registro de Imóveis – Escritura de compra e venda – imóvel arrematado em leilão público promovido pela credora fiduciária – recusa de registro sob o fundamento de que não há prova da entrega do valor excedente apurado às devedoras fiduciantes, nos termos do §4º do art. 27 da Lei 9.514/97 – obrigação de natureza pessoal e estranha à qualificação do título apresentado – exigência indevida – recurso provido – dúvida julgada improcedente – registro do título determinado.

Fonte: Observatório do Registro | 10/02/2016.

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CGJ/MA regulamenta indicação de interinos para Cartórios

A Corregedora Geral da Justiça, desembargadora Anildes Cruz, definiu critérios objetivos de designação de administradores interinos para as vagas existentes na administração dos cartórios do Estado do Maranhão. A medida já está em vigor e foi comunicada à Corregedoria Nacional de Justiça.

O Provimento nº 5/2016, assinado pela corregedora no último dia 2 de fevereiro, definiu critérios para a designação de interinos para as serventias extrajudiciais e poderá ser consultado no Diário da Justiça eletrônico e no site da CGJ-MA (http://www.tjma.jus.br/cgj/index), no item “atos administrativos”.

Com a regulamentação da matéria, a Corregedoria deve adequar as atuais designações à nova norma, no prazo de 180 dias. “Vamos analisar criteriosamente, caso a caso, conforme o disposto no Provimento”, informou a corregedora Anildes Cruz.

CRITÉRIOS – No documento, a desembargadora considerou a inexistência de critérios objetivos estabelecidos em norma para o tratamento dessa questão e definiu que a designação de interinos para as serventias vagas devem atender à Resolução nº 80/2009 do Conselho Nacional de Justiça, que trata da vacância dos serviços notariais e de registro ocupados em desacordo com as normas constitucionais relacionadas à matéria.

Conforme o documento, a designação de interinos para as serventias deverá ser, preferencialmente, sobre delegatário de serviço notarial ou de registro de igual natureza e do mesmo município em que esteja instalada a serventia vaga, seguindo alguns critérios estabelecidos no Provimento.

O delegatário não pode estar com obrigações pendentes junto ao Fundo Especial de Modernização e Reaparelhamento do Poder Judiciário (FERJ); não pode ter sido condenado por decisão judicial ou administrativa relacionada ao exercício da função, mesmo que esteja sob efeito suspensivo; e responderá apenas por uma serventia, além da que é titular.

Fonte: TJ/MA | 05/02/2016.

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