Artigo: Loteamento fechado e a polêmica livre associação – Por Marla Camilo

Devido à má qualidade de vida urbana gerada por causa da ocupação inadequada do solo nos grandes centros e interior, alguns empreendedores do ramo imobiliário têm implantado empreendimentos dotados de comodidade, segurança, saneamento básico, dentre outros atrativos dando ensejo a uma nova modalidade de parcelamento de solo urbano chamado loteamento fechado.

Apesar de não possuir legislação própria, o loteamento fechado é norteado pela principal legislação que regulamenta a questão do parcelamento do solo urbano, a Lei Federal 6766/79. Assim, se submete à aprovação da Prefeitura com transferência gratuita das áreas das vias públicas e espaços livres ao Município para subsequente inscrição no Registro de Imóveis.

Nessa medida, aprovado o projeto de loteamento fechado pela Prefeitura, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação, acompanhado dos documentos exigidos pelo artigo 18 da lei 6766/79.

A existência de protestos, de ações pessoais ou de ações penais, exceto as referentes a crime contra o patrimônio e contra a administração, não impedirá o registro do loteamento fechado se o requerente comprovar que esses protestos ou ações não poderão prejudicar os adquirentes dos lotes. E, se o Oficial do Registro de Imóveis julgar insuficiente a comprovação feita, suscitará a dúvida perante o juiz competente (artigo 18, §2º da Lei 6766/79).

Examinada a documentação e encontrada em ordem, o Oficial do Registro de Imóveis encaminhará comunicação à Prefeitura e fará publicar, em resumo e com pequeno desenho de localização da área, edital do pedido de registro em 3 (três) dias consecutivos, podendo este ser impugnado no prazo de 15 (quinze) dias contados da data da última publicação (artigo 19, Lei 6766/79). Findo o prazo sem impugnação, será feito imediatamente o registro (artigo 19, §1º, Lei 6766/79).

Se houver impugnação de terceiros, o Oficial do Registro de Imóveis intimará o requerente e a Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, para que sobre ela se manifestem no prazo de 5 (cinco) dias, sob pena de arquivamento do processo. Com tais manifestações o processo será enviado ao juiz competente para decisão. Ouvido o Ministério Público no prazo de 5 (cinco) dias, o juiz decidirá de plano ou após instrução sumária, devendo remeter ao interessado as vias ordinárias caso a matéria exija maior indagação (artigo 19, §1º e §2º, Lei 6766/79).

O Oficial do Registro de Imóveis que efetuar o registro em desacordo com as exigências dessa Lei ficará sujeito à multa equivalente a 10 (dez) vezes os emolumentos regimentais fixados para o registro, na época em que for aplicada a penalidade pelo juiz corregedor do cartório, sem prejuízo das sanções penais e administrativas cabíveis (artigo 19, §4º, Lei 6766/79).

Registrado o loteamento, o Oficial de Registro comunicará, por certidão, o seu registro à Prefeitura (artigo 19, §5º, Lei 6766/79). O registro será feito por extrato com uma indicação para cada lote, com a averbação das alterações, a abertura de ruas e praças e as áreas destinadas a espaços livres ou a equipamentos urbanos (artigo 20, Lei 6766/79).

Quando a área loteada estiver situada em mais de uma circunscrição imobiliária, o registro será requerido primeiramente perante aquela em que estiver localizada a maior parte da área loteada. Assim, realizado o registro nessa circunscrição, o interessado requererá, sucessivamente, o registro do loteamento em cada uma das demais, comprovando perante cada qual o registro efetuado na anterior, até que o loteamento seja registrado em todas. Denegado registro em qualquer das circunscrições, essa decisão será comunicada, pelo Oficial do Registro de Imóveis, às demais para efeito de cancelamento dos registros feitos (artigo 21, Lei 6766/79).

Após ser registrado, o registro do loteamento fechado só poderá ser cancelado por decisão judicial; a requerimento do loteador, com anuência da Prefeitura, ou do Distrito Federal quando for o caso, enquanto nenhum lote houver sido objeto de contrato; a requerimento conjunto do loteador e de todos os adquirentes de lotes, com anuência da Prefeitura, ou do Distrito Federal quando for o caso, e do Estado (artigo 23, Lei 6766/79).

O loteamento fechado deve observar algumas condições para que haja existência de fato, tais como: a) deve estar cercado ou murado; b) o acesso deve ser feito por um ou dois locais, com portaria e guarita nessas entradas, submetendo o morador à identificação prévia; c) as ruas, as praças, as vias de comunicação e outros logradouros públicos ou espaços livres têm seu acesso limitado aos proprietários dos lotes e às pessoas que eles autorizam entrar, o que é feito através de permissão ou concessão de uso de bem público, outorgado pelo Município; d) as vias de comunicação, praças e espaços livres do loteamento são de propriedade do Município, alterando-se apenas o direito de uso concedido somente aos proprietários de lote daquele loteamento; e) haverá necessidade de manutenção e conservação das vias de circulação, praças e espaços livres quando o Município não se incumbir de fazer; f) a manutenção da portaria, serviço de vigilância, coleta de lixo, captação, tratamento e distribuição de água e esgoto, pavimentação, limpeza das ruas, dentre outros serviços, são prestados por uma associação de moradores, com registro no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas, que administrará o funcionamento do loteamento, gestão da receita, da despesa e da cobrança pelos serviços prestados.

Questão que tem surtido discussões é sobre eventual abusividade da alegação do direito à livre associação por parte daqueles que visam eximir-se da obrigação do custeio de manutenção e serviços do loteamento fechado. De acordo com recente decisão firmada pela Segunda Seção do STJ, o ministro Marco Buzzi afirmou que a análise de possível violação ao princípio do enriquecimento sem causa, nos casos julgados, deve ser feita à luz da garantia fundamental da liberdade associativa.

O STF já havia se manifestado a respeito quando o ministro Marco Aurélio de Mello em seu parecer no Recurso Extraordinário 432.106 tratou de sustentar que seria ilegal a cobrança de taxas por Associações de Moradores. Expôs o Ministro Marco Aurélio. “Ninguém pode ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”.

A decisão foi tomada no julgamento de um recurso apresentado à Súmula 79, editada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, permitindo a prática. “Em respeito ao princípio que veda o enriquecimento sem causa, as associações de moradores podem exigir dos não associados, em igualdade de condições com os associados, que concorram para o custeio dos serviços por elas efetivamente prestados e que sejam do interesse comum dos moradores da localidade”, diz a súmula.

As cortes superiores têm sustentado que as taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou os que a elas não anuíram já que as obrigações de natureza real ou contratual pressupõem a existência de uma lei que as exija ou de um acordo firmado com a manifestação expressa de vontade das partes pactuantes.

Assim, ressalta-se a fundamental importância de que os contratos de compra e venda do imóvel e demais instrumentos de regência da convivência em comum entre proprietários/adquirentes nos loteamentos fechados introduzam expressamente cláusulas mencionando as obrigações dos adquirentes de participarem do rateio mensal para manutenção e conservação do empreendimento, a fim de afastar controvérsias sobre tal obrigação.

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Referências Bibliográficas

BRASIL. Lei 6015, de 31 de dezembro de 1973. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6015original.htm. Acesso em 29 setembro 2015.

______. Lei 6766, de 19 de dezembro de 1979. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6766compilado.htm. Acesso em 29 setembro 2015.

______. Sindicato da Habitação do Estado de São Paulo – Secovi SP. Decisão do STJ sobre cobrança de taxa associativa nos loteamentos. Disponível em: http://www.secovi.com.br/condominios/noticias/decisao-do-stj-sobre-cobranca-de-taxa-associativa-em-loteamentos/9336/. Acesso em 29 setembro 2015.

______. STJ. Associação de moradores não pode exigir taxas de quem não é associado. Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/noticias/noticias/%C3%9Altimas/Associa%C3%A7%C3%A3o-de-moradores-n%C3%A3o-pode-exigir-taxas-de-quem-n%C3%A3o-%C3%A9-associado. Acesso em 29 setembro 2015.

SERRA, Márcio Guerra; SERRA, Monete Hipólito. Registro de Imóveis III. Procedimentos Especiais. São Paulo: Saraiva, 2013.

VALÉSI. Raquel Helena. Questões controvertidas no Supremo Tribunal Federal sobre as obrigações dos adquirentes de lotes em loteamentos fechados. Disponível em: http://www.usjt.br/revistadireito/numero-1/12-raquel-valesi.pdf. Acesso em 29 setembro 2015.

Fonte: Notariado | 05/10/2015.

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Artigo: Não tem culpa o cartório – Por Marco Antonio de Oliveira Camargo

Por Marco Antonio de Oliveira Camargo*

A firma foi reconhecida, a transferência do veículo está bloqueada. O comprador não consegue regularizar, o vendedor não sabe o que fazer e tem gente querendo pôr toda culpa no cartório.

É difícil de imaginar situação tão absurda; mas é verídica.

Em dezembro de 2014 o proprietário de um veículo automotor compareceu em cartório, portando um documento de transferência de propriedade de veículo, completamente preenchido com dados do comprador, mas ainda sem nenhuma assinatura.

Então ele, vendedor, assinando o documento e o livro de registro de sua presença em cartório – ato necessário para o registro de reconhecimento de firmas por autenticidade – fez realizar o instrumento de reconhecimento de sua assinatura, restando pendente, para realização em um segundo momento, a assinatura do comprador e o posterior reconhecimento de sua assinatura.

Em menos de dois dias úteis, conforme determinação legal, este tabelionato providenciou a Comunicação de Transferência de Propriedade de Veículo junto à Secretaria da Fazenda do Estado.

Aparentemente tudo havia ocorrido normalmente, entretanto, neste início de outubro de 2015, o vendedor do veículo retornou ao cartório e relatou o drama vivido por ele nos últimos meses.

O adquirente, pessoa de seu círculo de amizade, não conseguiu concluir a transferência da propriedade daquele veículo por conta de um bloqueio na sua transmissão, em razão da existência da comunicação de transferência do mesmo veículo para terceira pessoa.

Não fosse a explicação dada por ele, ninguém iria entender o acontecido.

De fato, nem nosso cartório e nem a Secretaria da Fazenda do Estado, são culpados pela dificuldade em concluir a transmissão da propriedade do citado veículo.

O erro causador de todo este problema ocorreu no preenchimento daquela Autorização Para Transferência de Veículo – ATPV.  Nela constou o número do registro da Carteira Nacional de Habilitação – CNH-DETRAN do comprador no local onde se deveria o preencher o número de seu CPF.

Um erro evidente e facilmente explicável.

Para o necessário preenchimento do “Recibo de Venda” (a citada ATPV) o comprador forneceu ao vendedor uma cópia de sua CNH e a correta indicação de seu endereço. De posse deste documento (cópia da Carteira Nacional de Habilitação) e informação, o vendedor preencheu a ATPV. Entretanto, por um lamentável descuido,  no lugar indicado para constar o número de CPF ele transcreveu o número de registro da CNH do comprador.

É publico e notório que o numero de Cadastro de Pessoa Física contém 9 dígitos principais e mais 2 dígitos de controle, resultando,  portanto,  em uma sequência de 11 dígitos, onde os dois últimos resultam de um cálculo matemático (algoritmo) capaz de conferir autenticidade à sequência anterior.

Tal característica singular do CPF, segundo se imagina, representaria garantia suficiente para evitar erros de digitação. Portanto, se indicada outra sequência numérica de 11 dígitos, no campo destinado à verificação de autenticidade de um número de CPF, legítimo seria esperar que, o sistema de recepção de informações, viesse a rejeitar a informação incorretamente prestada.

Mas, curiosamente, no caso em análise, isso não ocorreu.  O número de registro da CNH do comprador daquele veículo não foi recusado ou identificado como inválido pelo sistema montado pela Fazenda Estadual para acolher a comunicações de venda realizada pelos cartórios do Estado de São Paulo

Por uma infeliz coincidência tal número de Registro de CNH é perfeitamente igual ao número de Cadastro de Pessoa Física – CPF de um cidadão totalmente alheio ao negócio realizado.

O que era ruim ficou pior quando, em uma demonstração de notável eficiência do sistema, o verdadeiro comprador do veículo, ao tentar concluir a transferência da propriedade daquele veículo se viu impedido de fazê-lo, na medida em que era outro o número de CPF do comprador que constava no DETRAN (conforme informação originada em nosso tabelionato e retransmitida pela Fazenda Estadual).

O leitor pode imaginar que isso seria um problema fácil de resolver, entretanto, infelizmente não é o que ocorre. O fato é que vários meses se passaram, muitas tentativas foram feitas, mas ninguém conseguiu resolver a confusão.

Segundo o meu cliente, a ultima informação por ele recebida, seria de que o problema, começado por uma comunicação originada neste cartório, deveria ser aqui solucionado.

Discordando totalmente desta posição, nesta primeira semana de outubro de 2015 (já 10 meses passados daquele reconhecimento de firma realizado), me propus a entregar para ele um documento escrito (um Atestado)  relatando a situação, em seus contornos curiosos.

Fico na expectativa de que exista bom senso em algum lugar desta burocracia e que alguém entenda a situação do modo como entendi. Para ilustrar o que digo, transcrevo adiantes o desfecho do documento que redigi, graciosamente lhe forneci e que, espero, venha a lhe servir de auxílio:

Salvo melhor juízo da autoridade competente para promover a conclusão do procedimento de Transferência de Propriedade do referido veículo, respeitosamente entende este tabelião, que o erro de indicação do número de Cadastro de Pessoa Física – CPF – do adquirente do veículo não invalida o documento assinado pelo vendedor e que referido documento, apesar de conter falha material, encontra-se íntegro e apto a produzir todos os seus efeitos jurídicos, sendo necessária apenas a realização de carta de correção; em forma análoga à que ocorreria se o erro verificado estivesse na indicação do endereço, grafia do nome ou data da realização do negócio.”

Para os colegas que atuam nesta seara fica a dica: não se surpreendam se casos parecidos como este aqui vivenciado venham a ocorrer em seus cartórios. O sistema concebido pelo Poder Público Estadual, para garantia da cobrança de IPVA (o objetivo nunca foi atenuar o problemas das multas de trânsito), pode falhar e, aparentemente, como o sistema ainda é recente, os seus operadores não sabem como solucionar este tipo de problema. Na dúvida ou insegurança, eles podem querer jogar a culpa para o cartório.

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* Marco Antonio de Oliveira Camargo é Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do Distrito de  Sousas

Fonte: Notariado | 06/10/2015.

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CSM/SP: Loteamento. Compromisso de compra e venda – cancelamento – inadimplemento. Pagamento superior a 1/3 do valor ajustado – restituição. Legalidade.

Cancelado o registro de compromisso de compra e venda de lote e tendo o promitente comprador pago mais de 1/3 do preço ajustado, novo registro do lote em favor de terceiro somente poderá ser realizado após a comprovação da restituição do valor pago pelo vendedor.

O Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo (CSM/SP) julgou a Apelação Cível nº 0030776-22.2013.8.26.0068, onde se decidiu que, no caso de cancelamento por inadimplemento de registro de compromisso de compra e venda de lote e tendo o promitente comprador pago mais de 1/3 do preço ajustado, novo registro do lote em favor de terceiro somente poderá ser realizado após a comprovação da restituição do valor pago pelo vendedor ao titular do registro cancelado ou mediante depósito em dinheiro à sua disposição junto ao Registro de Imóveis. O acórdão teve como Relator o Desembargador Hamilton Elliot Akel e o recurso foi, por unanimidade, julgado improvido.

O caso trata de apelação cível interposta objetivando a reforma da r. sentença que manteve a recusa do Oficial de Registro de Imóveis, referente ao registro do instrumento particular de compromisso de compra e venda, cujo objeto é um lote de loteamento residencial. Em suas razões, a recorrente alegou a possibilidade, tendo em vista o contrato celebrado, de retenção de valores pela loteadora em caso de inadimplemento do comprador, afastando a incidência do art. 35 da Lei nº 6.766/79.

Ao julgar o recurso, o Relator apontou que, conforme art. 35 da Lei nº 6.766/79, ocorrendo o cancelamento do registro do contrato e tendo havido o pagamento de mais de 1/3 do preço ajustado, o Oficial Registrador, depois de mencionar tal fato no ato do cancelamento e a quantia paga, somente efetuará novo registro relativo ao mesmo lote após a comprovação da restituição do valor pago pelo vendedor ao titular do registro cancelado, ou mediante depósito em dinheiro à sua disposição junto ao Registro de Imóveis. De acordo com o Relator, tal norma não teve sua inconstitucionalidade declarada, estando em vigor e devendo o Oficial Registrador observá-la, em respeito ao Princípio da Legalidade. Por fim, o Relator entendeu que somente na esfera jurisdicional a apelante poderá discutir e tentar o afastamento do referido artigo para que o registro não seja mais obstado.

Íntegra da decisão

Diante do exposto, o Relator votou pelo improvimento do recurso.

Fonte: IRIB

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