1ª VRP/SP: Organizações Religiosas: em caso de omissão do estatuto ou da legislação, incidem, por analogia, as regras referentes às associações (Processo nº. 1075508-38.2014.8.26.0100, DJE de 03/10/2014).


  
 

Processo 1075508-38.2014.8.26.0100 – Pedido de Providências – REGISTROS PÚBLICOS – M.G.C.U.B.N.N.O. – Organizações religiosas – inexistência de normas específicas no Código Civil – aplicação, por analogia, das relativas às associações – possibilidade Vistos. Trata-se de pedido de providências formulado por Movimento Gnóstico Cristão Universal do Brasil na Nova Ordem, representado por José Maria de Carvalho em face da negativa do Oficial do 1º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital em proceder a averbação da Ata da Assembléia que destituiu a presidente Clenar Denise Colleoni de Abreu. Relata a requerente que é organização religiosa que se divide em grupos de práticas em vários Municípios do território nacional e, em 02.12.2013, foi encaminhado edital de convocação para Assembléia Geral, constando dentre as ordens do dia o “item 5” (propostas dos grupos de práticas/ alteração estatutária), visando a análise da conduta da presidente e do vice presidente. Informa que na Assembléia foi decidido pela destituição da presidente, que se encontrava suspensa de seu cargo, restando prejudicada a análise das condutas do vice presidente em razão de sua renúncia. Segundo o Oficial Registrador (fls. 67/74), o óbice refere-se a ausência de previsão expressa no edital acerca da destituição do presidente, conforme preceitua o artigo 59, parágrafo único, do Código Civil. Juntou documentos às fls.75/90. O requerente manifestou-se às fls.93/95. Aduz que no item 5 do edital, intitulado “Propostas dos Grupos de Práticas/ Alterações Estatutária”, encontra-se implicitamente a análise da questão supra mencionada. O Ministério Público opinou pelo indeferimento do pedido (fl. 99). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Com razão o Registrador e a D Promotora de Justiça. Levando-se em consideração a inserção das organizações religiosas no rol do art. 44, do Código Civil, quis o legislador distingui-las das associações e das demais pessoas jurídicas de direito privado lá arroladas. Mas não é menos certo que, dentre todas as pessoas jurídicas que constam de referido rol, as associações são as que mais se aproximam das organizações religiosas, razão pela qual a semelhança do regime jurídico de ambas aconselha que, em caso de omissão do estatuto ou da legislação, incidam, por analogia, as regras referentes às associações. A analogia consiste no processo lógico pelo qual o aplicador do direito estende o preceito legal aos casos não diretamente compreendidos em seu dispositivo. Pesquisa a vontade da lei, para levá-la às hipóteses que a literalidade de seu texto não havia mencionado (Serpa Lopes, citado por Arnaldo Rizzardo, in Parte Geral do Código Civil, Ed. Forense, 5ª ed., pág. 64). Carlos Roberto Gonçalves lembra que: “O legislador não consegue prever todas as situações para o presente e para o futuro, pois o direito é dinâmico e está em constante movimento, acompanhando a evolução da vida social, que traz em si novos fatos e conflitos. Ademais, os textos legislativos devem ser concisos e seus conceitos enunciados em termos gerais. … A própria lei, prevendo a possibilidade de inexistir norma jurídica adequada ao caso concreto, indica ao juiz o meio de suprir a omissão, prescrevendo, igualmente, o art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”” (Direito Civil Brasileiro, Ed. Saraiva, Vol. I, pág. 48. Nessa senda, a doutrina de Arnaldo Rizzardo que, ao discorrer sobre as organizações religiosas, entende que: “A forma livre de sua constituição, entrementes, não importa em desconsiderar requisitos mínimos , que são os das associações, pela semelhança de natureza. Do contrario, importa na sua indefinição e na própria inexistência” (Parte Geral do Código Civil, Ed. Forense, 5ª ed., pág. 285). Portanto, é possível que, em caso de omissão do estatuto da organização religiosa, e diante da inexistência de normas específicas para as organizações religiosas, apliquem-se, por analogia, as regras das associações, o que não implicará indevida ingerência em seus assuntos internos, mas simples regulamentação da forma pela qual se darão sua organização e funcionamento. No caso em exame, os interessados valeram-se do art. 59, inciso I, do Código Civil, que cuida da convocação dos órgãos deliberativos das associações, para legitimar a convocação da assembléia cuja ata pretendem averbar. Ocorre que, nos termos do artigo 59, parágrafo Único do CC: “ Para as deliberações a que se referem os incisos I e II deste artigo é exigido deliberação da assembleia especialmente convocada para esse fim…” (g.n) Logo, deve constar expressamente do edital, dentre as ordens do dia, a destituição da presidente (Srª Clenar Denise Colleoni de Abreu), primeiramente em consonância ao princípio da publicidade registrária, onde dá-se ampla ciência aos votantes acerca dos itens a serem avaliados, e em segundo lugar ao fato de que a irregular destituição acarreta sérios prejuízos à pessoa jurídica, principalmente em relação à terceiros de boa fé. Assim, diante do exposto, indefiro o pedido de providências formulado por Movimento Gnóstico Cristão Universal do Brasil na Nova Ordem, mantendo o óbice registrário. Não há custas, despesas processuais, nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. São Paulo, 29 de setembro de 2014. Tania Mara Ahualli Juíza de Direito – ADV: LUÍS FERNANDO PALMITESTA MACEDO (OAB 196302/SP)

Fonte: DJE/SP | 03/10/2014.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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