CSM: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Negativa de ingresso de escritura de venda e compra de imóvel – Desrespeito ao registro anterior de instrumento particular – Desnecessidade da anuência dos compromissários compradores – Inexistência de afronta ao Princípio da Continuidade – Recurso provido.


  
 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 0025566-92.2011.8.26.0477

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0025566-92.2011.8.26.0477, da Comarca de Praia Grande, em que é apelante OSVALDO ROBERTO BORBA SILVA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E ANEXOS DA COMARCA DE PRAIA GRANDE.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores IVAN SARTORI (Presidente), GONZAGA FRANCESCHINI, ELLIOT AKEL, SILVEIRA PAULILO, SAMUEL JÚNIOR E TRISTÃO RIBEIRO.

São Paulo, 10 de dezembro de 2013

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível n° 0025566-92.2011.8.26.0477

Apelante: Osvaldo Roberto Borba Silva

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoa Jurídica e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Comarca de Praia Grande

VOTO N° 21.367

Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Negativa de ingresso de escritura de venda e compra de imóvel – Desrespeito ao registro anterior de instrumento particular – Desnecessidade da anuência dos compromissários compradores – Inexistência de afronta ao Princípio da Continuidade – Recurso provido.

O Oficial do Registro de Imóveis e Anexos de Praia Grande deixou de proceder ao registro de Escritura Pública de Venda e Compra apresentada por Osvaldo Roberto Borba Silva, referente ao imóvel objeto da matrícula 8.027, o que suscitou a apresentação de dúvida, a pedido do interessado. Ressalta o Oficial a impossibilidade do ingresso no fólio registral em decorrência da quebra do princípio da continuidade, uma vez que o imóvel estava compromissado à venda em favor de Antônio Lopes e houve a transmissão da propriedade sem que este cedesse seus direitos ou com ela anuísse (fl. 02).

O interessado ofertou impugnação fundamentada a fls. 25/37.

O MM. Juiz Corregedor Permanente acolheu as ponderações do Oficial do Registro de Imóveis e manteve a recusa à realização do ato, julgando procedente a dúvida suscitada (fls. 39/40).

Inconformado, interpôs o interessado recurso de apelação, reiterando as razões anteriormente expostas (fls. 44/55).

A Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo provimento do recurso (fls.64/66).

É o relatório.

Assiste razão ao recorrente.

O Registrador, em sua nota devolutiva, sustentou que, enquanto não resolvida questão relacionada com a promessa de venda e compra registrada em favor de terceiro, não seria possível o ingresso do título de transmissão de propriedade, em respeito ao princípio registrário da continuidade (fl. 19).

Em sua sentença, o MM. Juiz Corregedor Permanente manteve o óbice ofertado pelo Registrador, ponderando que o registro de compromisso, cessão ou promessa de cessão só poderão ser cancelados por decisão judicial, a requerimento conjunto das partes contratantes ou quando houver rescisão comprovada do contrato, sendo que no caso em tela permanece íntegro o registro da promessa de venda e compra do bem a terceiro que não participou do negócio entabulado (fl. 39 v°).

Constata-se, pelo exame da documentação juntada aos autos, que o bem em questão foi compromissado à venda em 23 de agosto de 1976 a Antônio Lopes e sua esposa (fl. 10v°). Em março de 1980, o titular de domínio alienou o bem a Roberto Pincus (fl.11), estando preservada a cadeia sucessória a partir de então.

A previsão de registro de contrato preliminar de alienação do domínio existe para dar publicidade à relação obrigacional e gera direitos para a parte prejudicada, caso haja sua inobservância.

Não tem este registro o condão de impedir a alienação do bem pelo titular de domínio que, a despeito dela, mantém o vínculo obrigacional com o compromissário.

Diante disso, entendo não ter ocorrido vício nos registros de transmissão, com a possibilidade de ingresso do título apresentado.

Como já decidido por este E Conselho, acolhendo voto de minha lavra (Processo 0020761-10.2011.8.26-0344, julgado em 25/10/12, da Comarca de Marília) e respeitados os precedentes da 1.a Vara de Registros Públicos desta Capital, em sintonia com a posição do Registrador, o princípio da continuidade, com a transmissão da propriedade pelos titulares de domínio sem a observância de compromisso de venda e compra registrado em favor de terceiros, não será vulnerado.

De todo modo, a possível falta de conhecimento dos compromissários compradores, a sua ocasional oposição à transmissão da propriedade do imóvel aos adquirentes e a eventual inoponibilidade das cessões de direito, com afastamento de sua repercussão sobre a situação jurídica dele, são circunstâncias despidas de força para comprometer a validade da compra e venda definitiva, para frear o acesso do título ao álbum imobiliário: quando muito, terão potência para relativizar a eficácia, não para atestar a invalidade da transferência coativa da propriedade.

Citando Marco Aurélio S. Viana: "não se justifica a exigência de registro prévio do contrato senão como forma de tutelar o promitente comprador contra a alienação por parte do promitente vendedor, limitando ou reduzindo o poder de disposição deste, ao mesmo tempo que arma o adquirente de sequela, admitindo que obtenha a escritura até mesmo contra terceiro, na forma indicada no art. 1.418." (Comentários ao novo Código Civil: dos direitos reais. Sálvio de Figueiredo Teixeira (coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 695 v. XVI.)

Assim sendo, uma vez constituído o direito real de aquisição, Francisco Eduardo Loureiro acentua, com propriedade: doravante, os "novos atos de disposição ou de oneração praticados pelo promitente vendedor em benefício de terceiros, ainda que de boa-fé, são ineficazes frente ao promitente comprador" (Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Ministro Cezar Peluso (coord.). 2.a ed. São Paulo: Manole, 2008. p. 1.453.). Realço: ineficazes, não inválidos.

Quero dizer: se o registro do instrumento particular de compromisso de venda e compra, desnecessário para obtenção da sentença substitutiva do contrato definitivo, não impede o promitente vendedor de transferir a propriedade a terceiros – embora seja idôneo para comprometer a eficácia deste negócio jurídico -, impõe, na mesma linha de entendimento, admitir que o registro de escritura de venda e compra pelos sucessores dos titulares do domínio prescinde do cancelamento do registro do compromisso de venda e compra, ainda que o promitente comprador não tenha participado do negócio jurídico posterior.

Ademais, como bem mencionado pelo D. Procurador da Justiça, o "erro" teria ocorrido há mais de trinta anos, sem notícia de que houvesse prejuízo ao promitente comprador ou a terceiro. O tempo decorrido impediria eventual pretensão de anulação do registro, pois atingiria terceiro de boa-fé que faria jus à usucapião, conforme disposto no artigo 214, § 5º, da Lei 6.015/73 (fls. 65/66).

Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto, dou provimento ao recurso.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator. (D.J.E. de 14.03.2014 – SP)

Fonte: DJE/SP | 17/03/2014.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.